terça-feira, 29 de julho de 2008

A Espera

Na mão direita uma surpresa.
A distração era tão harmoniosa que era sempre no último instante que evitávamos esbarrar contra o outro.
E era nesse segundo que espreitava a capa do livro.
E reconhecia-o.
Se me perguntassem como ele era, não saberia responder. Pelo menos dar aqueles traços gerais. Não existiam traços gerais.
Só um conjunto de pormenores que o tornavam impossível de reconhecer por outras pessoas.
Vejo um corpo franzino sustentado por duas vincadas patilhas; como duas molas de roupa mantinham a sua postura erecta mas sempre instável.
Uma espécie de Corto Maltese em que cada página é um passo, e o seu destino não ia além do próximo passo.
Por vezes encontrava-o nas arcadas a olhar o horizonte, e o horizonte não era mais que o prédio em frente. Os seus olhos não tinham fundo.
Então começámos a trocar cumprimentos discretos e aos poucos fomos falando.
Uma manhã a sua cabeça baixa foi o suficiente para o abordar.
Perguntei o que se passava.
-" Estou à espera."
Sabia o que esperava mas não o nomeava.
Dissse que normalmente a ausência não se fazia sentir com tanta intensidade, nem por tanto tempo.
Insuportável.
Só pedia um momento, por muito breve que fosse, mas novamente.
Esperava com paciência mas dorido, em sofrimento.
E a ausência nele, encheu-me.
Afastei-me.
O seu entregue ao seu momento.

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